Enquanto em situações cotidianas atos como tirar vantagem de terceiros e revelar segredos podem ser vistos como imorais, no mercado financeiro essas ações assumem contornos criminais. A prática de insider trading, considerada crime financeiro desde 2001, envolve o uso de informações privadas e relevantes de uma empresa (insider information) que ainda não são conhecidas pelos demais investidores, com o objetivo de lucrar em negociações de ativos no mercado de capitais.

Quer entender melhor o que são insider trading e insider information? Então siga comigo neste artigo, onde explicarei tudo o que você precisa saber para dominar esse assunto, incluindo:

  • O que é insider trading?
  • Como funciona o insider trading?
  • Quais os tipos de insider trading?
  • Qual é a diferença entre insider trading e front running?
  • Quais são as consequências do insider trading para o mercado?
  • Qual é a punição contra o insider trading?
  • O que é insider information?
  • Como funciona o insider information?
  • Exemplos de uso de insider information.

Vamos nessa!

O que é insider trading?

Insider trading é um crime financeiro que consiste no uso de informação privilegiada e privada (insider information) desconhecida por outros investidores para a obtenção de vantagens e lucros pessoais — ou para terceiros — em negociações na bolsa de valores.

Esse delito ocorre quando alguém usa de seu acesso a notícias confidenciais que devem ocasionar flutuações nas ações de uma companhia para se antecipar às movimentações de mercado. Na prática, o que essa pessoa faz é tirar vantagem da situação para adquirir ou se desfazer de seus ativos, antes que essas informações venham a público. 

Como esses dados não são públicos, o insider trading só pode ser cometido por colaboradores  de uma empresa com ações negociadas em bolsa, e  que tenham acesso a informações sigilosas. Não por acaso, tratam-se, na maioria dos casos, de executivos de alta hierarquia, gestores ou conselheiros.

Como funciona o insider trading?

O insider trading funciona como um movimento ilícito de antecipação ao mercado. Acontece quando um colaborador de uma companhia, em posse de alguma informação relevante e privada, se aproveita para comprar ou vender suas ações antes que essas notícias sejam reveladas e promovam flutuações nos preços dos ativos emitidos por esta empresa.

Por exemplo, um colaborador que saiba de uma fusão ou aquisição que está para acontecer, pode usar dessa informação para comprar ações da companhia antes que essa notícia seja anunciada, lucrando com a eventual alta destes papéis no mercado.

Em um cenário contrário, um funcionário que esteja ciente de algum escândalo interno que deve impactar negativamente a imagem de uma companhia, pode se antecipar e vender suas participações, antes que essa polêmica se espalhe, evitando perder dinheiro.

No Brasil, a atuação de insiders é investigada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em casos mais graves, pode haver a intervenção do Ministério Público. Entre os indícios mais comuns dessa prática estão movimentações atípicas no volume de negociação de ações, ou a observação de transações incomuns pouco antes da divulgação de alguma notícia significativa.

Quais os tipos de insider trading?

O insider trading é normalmente classificado em dois tipos. São eles: 

  • Insider trading primário;
  • Insider trading secundário.

Essa diferenciação se dá pela relação mantida entre quem pratica o crime e a empresa em questão. Abaixo, explico isso melhor:

Insider trading primário

O insider trading primário ocorre quando este crime financeiro é cometido por uma pessoa que, devido a seu cargo ou função, naturalmente teria acesso às informações sigilosas da companhia. Em outras palavras, alguém de quem se espera que saiba das notícias e decisões internas de uma empresa, ainda desconhecidas do público. 

Nesse caso, o insider poderia ser um acionista majoritário, um gestor ou algum funcionário de alto escalão. Pode ainda ser um prestador de serviço, como um advogado da companhia ou um contador responsável pelas auditorias.

Insider trading secundário

O insider trading secundário, por sua vez, acontece quando a pessoa que comete este tipo de crime não tem relação aparente com a empresa. Não é um funcionário e, portanto, não deveria ter acesso às informações relevantes das quais está tirando proveito.

Esse tipo de crime normalmente acontece com o auxílio de um “laranja”. Ou seja, um funcionário da empresa, para dificultar o rastreamento do crime, divulga a informação para alguém próximo ou um conhecido (um terceiro), quem irá operar na bolsa e, futuramente, compartilhar os lucros obtidos. A título de curiosidade, o ato de repassar informação sigilosa de um colaborador para um terceiro também é conhecido no vocabulário financeiro como “tipping”.

Embora menos comum, o insider trading secundário também pode acontecer por meio de um vazamento acidental, como o envio acidental de uma e-mail, escuta de conversa, ou a divulgação inadvertida de informação relevante em alguma live. Assim, alguma pessoa que não mantinha nenhuma relação com a empresa e nem com seus colaboradores pode ficar sabendo de notícias internas da companhia, que podem ser utilizadas para seu benefício próprio. 

Importante: independentemente do tipo e de quem a prática, a prática de insider trading é ilegal e pode resultar em acusaçao criminal, multa e prisão. Mas tudo ao seu tempo. Logo mais falarei especificamente sobre a legislação que compete a esse tipo de crime financeiro. 

Qual é a diferença entre insider trading e front running?

Ambos, o insider trading e o front running, são crimes financeiros relacionados ao uso de conhecimento confidencial para auferir lucro com a antecipação dos movimentos de mercado. A diferença entre essas duas práticas está principalmente em seus agentes

O insider trading é cometido por funcionários — ou terceiros comunicados por estes — que se valem de notícias internas e ainda não divulgadas de uma empresa para comprar ou vender ações desta, antes que essas informações passem a ser de conhecimento comum.

O front running, por sua vez, é um tipo de crime associado estritamente a corretores de valores mobiliários e intermediários financeiros. Embora seja um estrangeirismo, a tradução do termo — “correr primeiro” — pode facilitar o entendimento de seu conceito.

Essa prática acontece quando um operador, ao receber a ordem de uma grande operação de um cliente — que seja capaz de influenciar no preço do ativo —, aproveita a situação e se antecipa com uma negociação particular, antes de executar o solicitado. 

Ou seja, o corretor “corre antes”. Sabendo que uma determinada ordem vai causar oscilações no mercado, toma a dianteira e realiza operações pessoais para se aproveitar da flutuação de momento.

Tipificada como crime pela Lei 13.506/2017, a prática de front running pode resultar em pena de 1 a 8 anos de reclusão, além de multa no valor de 3 vezes o lucro obtido ilicitamente como resultado do crime. 

Quais são as consequências do insider trading para o mercado?

Observado desde uma perspectiva mais ampla, práticas como o insider trading têm o potencial para causar danos a todo o mercado financeiro. A incidência desse tipo de crime financeiro pode afetar principalmente a integridade e a confiabilidade da bolsa de valores, afastando potenciais investidores.

Para ter uma ideia mais clara de o quão prejudicial esse tipo de crime pode ser, vale discorrer brevemente sobre algumas das principais consequências negativas do insider trading para o mercado:

  • Afeta a igualdade de informações: ao criar uma vantagem injusta para quem têm acesso a informações privadas, essa prática prejudica a igualdade de condições no mercado, fazendo com que os demais investidores possam sofrer perdas injustas;
  • Aumento da volatilidade: esse tipo de crime também pode ocasionar uma maior volatilidade ao mercado, já que o preço das ações pode responder inesperadamente as negociações baseadas em informações não públicas;
  • Custos de compliance mais elevados: o aumento de crimes financeiros pode levar as autoridades reguladoras a impor regras mais rígidas, o que pode aumentar os custos de conformidade para todas as empresas e participantes do mercado;
  • Desestímulo ao investimento: a impressão de que a bolsa de valores é injusta ou pode ser manipulada, também pode acabar afastando investidores, principalmente os menores e menos experientes;
  • Distorção dos preços: o insider trading também pode levar a distorções nos preços dos ativos, fazendo com seus valores deixem de refletir de forma coerente às condições de mercado;
  • Perda de confiança dos investidores: o insider trading pode comprometer o princípio de que os preços das ações refletem todas as informações disponíveis ao público, prejudicando a confiança dos investidores em relação ao mercado.

Além das consequências para o mercado de modo geral, o insider trading também pode ocasionar sérios danos reputacionais para a empresa e os funcionários envolvidos na situação. A perda de confiança do mercado pode afastar investidores, clientes, parceiros comerciais e mesmo novos talentos.

Qual é a punição contra o insider trading?

A prática de insider trading é considerada como ilegal em diversos países, incluindo o Brasil. Por aqui, a punição prevista para esse tipo de operação corresponde a reclusão de 1 a 5 anos, e multa de até 3 vezes o montante da vantagem ilícita obtida. O tamanho da pena varia de acordo com a relação do envolvido com a companhia e sua reincidência.

Esse tipo de fraude passou a ser tipificado oficialmente como crime financeiro em 2001, com a promulgação da Lei 10.303, que adicionou o capítulo ªDos crimes contra o mercado de capitais” à Lei 6.385/1976 (que dispõe sobre o funcionamento do mercado mobiliário). A prática de insider trading é exposta especificamente no artigo 27-D da supracitada legislação, que a define como:

  • “Utilizar informação relevante de que tenha conhecimento, ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiros, de valores mobiliários.ª

De acordo com a lei, a punição vale tanto para quem repassar informações sigilosas propositalmente a um terceiro, quanto para quem se vale destas para antecipar movimentos de mercado, lucrando com a negociação de ativos. A penalidade, neste caso, é aumentada em ⅓ (um terço) para o operador em relação ao informante.

A multa, por sua vez, deve ser aplicada de acordo com o “dano provocado ou com a vantagem ilícita que tenha sido auferida pelo agente”. Em caso de reincidência, as multas podem chegar ao triplo do lucro obtido com o crime.

A fiscalização deste tipo de prática cabe à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), . Esse órgão, enquanto responsável pelo bom funcionamento do mercado de valores mobiliários, tem o poder de aplicar advertências e, até mesmo, inabilitar a atuação de operadores, e suspender os cargos administrativos das partes envolvidas no trâmite.

O que é insider information?

Insider information, caso se traduza literalmente é “informação interna” e na realidade, trata-se praticamente disso mesmo.

Afinal, Insider information nada mais é do que uma informação interna, da qual as pessoas que não trabalham na empresa ou o público em geral não tem conhecimento. 

Mas atenção: não trata-se de qualquer informação. Estou falando do que o Direito Brasileiro considera como “informações relevantes”, de acordo com o artigo 157 da Lei 6.404/76, o qual dispõe sobre sociedades por ações: 

  • “Informações relevantes são aquelas referentes a fatos ocorridos nos negócios da companhia, que possam influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários de sua emissão”.

Esse é, portanto, o tipo de informação que pode ser ilegalmente utilizada por insiders para obter vantagens no mercado de capitais, adquirindo ou se desfazendo de ações com base em fatos desconhecidos dos demais investidores.

 Entre as informações com esse tipo de natureza estão:

  • Aquisições e fusões;
  • Concessões;
  • Descoberta ou desenvolvimento de novas tecnologias;
  • Divulgação de resultados financeiros;
  • Falência iminente ou recuperação judicial;
  • Formação de parcerias estratégicas ou acordos firmados com outras empresas;
  • Informações sobre novas regulamentações;
  • Lançamento de novos produtos ou serviços;
  • Litígios ou resoluções de processos judiciais;
  • Mudanças na distribuição de dividendos;
  • Mudanças significativas na gestão.

Por exemplo, um colaborador da empresa X fica sabendo que esta vai adquirir outra determinada empresa Y. Devido a este motivo e por essa transação ser vantajosa, essa pessoa sabe que as ações da empresa X  irão entrar em um período de alta. Esta informação é chamada de insider information.

Vale lembrar que isto é válido apenas para empresas que são negociadas em bolsas de valores. Até porque não há como utilizar informação de uma companhia que não é listada (ou está em processo de IPO) para obter vantagem no mercado, negociando suas ações.

É importante observar que ter conhecimento de alguma insider information não é ilegal. O problema está em tirar proveito dessas informações desconhecidas para lucrar com a negociação de ativos.

Como funciona o insider information?

Como bem sugere o próprio termo, uma insider information funciona como uma informação confidencial. Se trata, mais especificamente, de uma notícia ainda não revelada ao público, mas que pode impactar significativamente o preço das ações ou outros valores mobiliários de uma empresa assim que se tornar conhecida.

Esse tipo de informação é teoricamente acessível apenas a pessoas que estão diretamente envolvidas com a empresa (insiders), como executivos, gestores e conselheiros, ou por prestadores de serviço que mantenham um relacionamento próximo com a empresa, como advogados, auditores e consultores.

Em resumo, o insider information é uma informação relevante, ainda não divulgada ao público, e que tem o potencial de causar mudanças significativas no preço das ações ou de outros títulos da empresa, para cima ou para baixo. 

As empresas têm a responsabilidade de gerenciar insider informations com cuidado, assegurando que esse tipo de notícia seja divulgada ao mercado de maneira adequada e equitativa para evitar qualquer vantagem indevida.

 A divulgação não autorizada, vazamento proposital ou uso indevido dessa informação por aqueles que naturalmente, por seu cargo ou função, têm acesso a ela é ilegal. Quem faz isso está cometendo o crime de insider trading, previsto na legislação que  trata dos crimes financeiros contra o mercado de capitais.

Qual a punição para insider information?

Não existe nenhuma punição relacionada a insider information, apenas para seu uso como ferramenta para ganhos ilícitos. Afinal, esta é a “matéria-prima” utilizada por quem comete crimes como insider trading e front running.

No jargão do mercado financeiro, insider information é por si só apenas um tipo de informação sigilosa e relevante sobre uma empresa listada na bolsa de valores. São, portanto, notícias ainda não conhecidas pelo público e que, quando explicitadas, podem ocasionar em alterações nos preços das ações desta companhia.

Ter conhecimento desse tipo de informação, contudo, não constitui crime. Inclusive, é normal e até consideravelmente óbvio que administradores, funcionários de alto escalão e mesmo certos prestadores de serviços estejam por dentro das decisões importantes que serão tomadas por uma empresa.

O crime está em se valer de insider information para obter ganhos no mercado financeiro, negociando ativos da empresa antes destas informações virem à tona. 

Quais são os exemplos do uso de insider information?

Um exemplo clássico do uso indevido de insider information ocorre quando um colaborador de uma determinada empresa fica sabendo que ela irá adquirir uma rival ou lançar uma nova tecnologia muito aguardada. Ele se antecipa à divulgação dessas notícias para comprar ações e aproveitar os movimentos do mercado. 

Do mesmo modo, o insider information, quando relacionado a uma notícia negativa para a companhia, pode ser ilegalmente utilizado de modo contrário. Nesse caso, o colaborador mal intencionado se antecipa ao anúncio da notícia, para vender suas participações. 

Em ambos os casos hipotéticos acima, o funcionário em questão está cometendo o chamado crime de insider trading primário, que ocorre quando um insider (pessoa com relação direta com a empresa) utiliza de informação confidencial para negociar ativos desta e obter lucros ilícitos no mercado de capitais. 

Entretanto, o uso criminoso de insider information também pode ocorrer de forma indireta. Nesse caso, em vez de utilizar informações sigilosas para fazer movimentações pessoais, o insider, em uma tentativa de dificultar o rastreamento, repassa essas notícias para um terceiro, quem opera em seu nome. Esse, por sua vez, é um exemplo básico de insider trading secundário.

Casos de insider trading no Brasil

Após mais de 20 anos desde que o insider trading foi tipificado como crime financeiro no Brasil, apenas duas sentenças condenatórias foram concluídas na esfera criminal brasileira: um caso envolvendo os executivos da Sadia, Romano Ancelmo Fontana e Luiz Murat, e outro relacionado ao Grupo EBX, conglomerado de Eike Batista. A grande maioria dos casos investigados foram resolvidos administrativamente.

O primeiro caso ocorreu em 2006, quando Fontana e Murat, respectivamente o diretor de finanças e o conselheiro de administração da Sadia à época, lucraram com a compra de ações da Perdigão na Bolsa de Nova Iorque. Logo após participarem das tratativas onde a Sadia tentou adquirir hostilmente a concorrente (o que significa que tentou comprar mais de 50% das ações, sem um acordo entre as partes), os dois correram para adquirir ações da Perdigão que, como esperado, acabaram disparando.

 Em 2011, a justiça brasileira condenou os executivos a cumprir prisão em regime aberto, pena que seria convertida, mais tarde, em prestação de serviços sociais. Além disso, a dupla teve que pagar multas no valor total de R$723 mil por insider trading, e mais R$557 mil por dano moral coletivo.

Já o caso envolvendo o Eike Batista ocorreu em 2013, quando o agora ex-bilionário teria se aproveitado de insider information para lucrar com a venda de ações da sua empresa OGX (hoje Dommo Energia), subsidiária do grupo EBX. Segundo a investigação, Batista, buscando evitar perdas, teria feito essas negociações antes de divulgar alterações do plano de negócios da companhia e problemas financeiros então enfrentados pelo grupo.

Para piorar a situação, Batista também foi acusado por divulgar comunicados e publicar posts falsos no antigo Twitter (agora X) para impulsionar a compra das ações da companhia e, assim, valorizar esses papéis. No total, estima-se que mais de 79 milhões de investidores foram prejudicados de alguma forma com essa operação.

Em 2021, o caso foi encerrado, e Eike Batista foi condenado a 11 anos e 8 meses de reclusão, além do pagamento de multas em um total de R$871 milhões, pelos crimes de insider trading e manipulação do mercado de capitais. Atualmente, o empresário cumpre sua pena em prisão domiciliar.

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